Recentemente, durante uma palestra sobre política e cidadania, fui questionado por um participante se eu concordava que Política e Fé não deveriam se misturar, uma vez que o estado é laico e, assim sendo, a Igreja deveria se manter afastada dos processos políticos existentes na nossa sociedade moderna. O meu interlocutor utilizou como exemplo a trágica experiência da Idade Média quando a Igreja e o Estado caminhavam juntas na condução dos assuntos governamentais.
Para surpresa das pessoas que me ouviam (surpresa essa que me motivou a abordar essa questão no artigo deste mês), eu concordei em parte com o interlocutor. Realmente, Fé e Política não podem se misturar. Elas são coisas distintas, porém se complementam na prática da vida. A Fé, sem a ação política como muito bem aborda a Carta de São Tiago (2, 14-25), é morta. A política até pode existir sem a vivência da fé desde que esteja pautada nos princípios da cidadania, da ética e da promoção do bem comum. Mas a Fé não pode viver sem as obras que a justifiquem. Essa passagem da carta apostólica de S. Tiago nos leva a concluir que a vivência da fé é necessária e tem como conseqüência a ação prática da política.
Logo de imediato, o meu interlocutor voltou a me questionar se eu não estava equivocado, uma vez que a carta de São Tiago mencionava a palavra "obras" no lugar da palavra "política" por mim mencionada. Realmente, ao lermos a carta não encontraremos a palavra "política" e sim "obras". Mas, qual o verdadeiro sentido da palavra "política"? Se pesquisarmos no dicionário, analisando a sua origem e o seu significado, descobriremos que ela retrata a relação do cidadão para com os demais membros de uma sociedade. "Político" vem de "polis" que quer dizer em grego, "cidade". E por sua vez, "política" vem do Grego "politiké" e pode ser perfeitamente entendida como o "cidadão que exerce plenamente a sua cidadania, respeitando e se relacionando bem com o próximo, buscando o perfeito equilíbrio entre os seus direitos e deveres e, acima de tudo, pautando todas as suas ações na preocupação efetiva de estabelecer prioritariamente o bem comum".
Acredito que esta correlação (fé x política) pode ser mais ampla, principalmente se continuarmos a leitura da carta apostólica de São Tiago. Também não podemos deixar de observar a ação pastoral de Jesus. Nela, veremos que Ele propagou a proposta da vida e do Reino de Deus, em choque com os partidários da morte e do reino de César. Sua espiritualidade abastecia-se na intimidade amorosa com o Pai e no contato direto com o povo. A sua vida pública era ao mesmo tempo intensa (Mt 9, 35) e fortemente pautada na oração (Lc 6, 12) principalmente em momentos de opções decisivas.
Outro aspecto que fortalece ainda mais esse relacionamento entre a Fé e a Política é a preocupação de Cristo com a inserção social (Mt 25, 31). Nesta passagem fica evidente o critério que Jesus nos passa ao separar as "ovelhas dos cabritos": A preocupação com o outro. Ele se coloca como sendo o menor dos irmãos ao afirmar, em resposta aos que perguntam sobre quando foi que o viram nu e o vestiram, o viram com fome e o deram de comer, o viram preso e foram-no visitar: "Quando fizeste isso ao menor dos meus irmãos, foste a mim que fizeste".
Se a política eleitoral e a ação dos mandatários são as principais ferramentas de promoção do bem comum numa sociedade democrática, não dá para dizer que o Cristão que assume verdadeiramente a sua fé pode deixar de lado a política, uma vez que esta também é um importante instrumento de instauração da justiça social.
São Tiago afirma que a fé sem obras é como um corpo sem alma. E um corpo sem alma está muito longe da proposta de Cristo para a vinda do Seu Reino.
Um forte abraço a todos e a Paz de Cristo!
Robson Campos Leite
Email: feepolitica@terra.com.br
fonte: http://www.loreto.org.br/mar2005_fe_politica.asp
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